Rita Costa Pereira, Psicóloga Clínica e da Saúde.
A gravidez é um dos momentos mais felizes da vida de um casal, é o reflexo de um amor a dois que resulta na conjugação do melhor de cada um, o bebé. Esta é uma fase nova e de mudanças radicais na vida de um casal que ruma à descoberta do desconhecido. Mas, se estar grávida não é perigoso, será normal vivenciar a gravidez com ansiedade?
A ansiedade é um estado emocional extremamente comum a qualquer ser humano, principalmente quando nos deparamos com situações de vida completamente novas e desconhecidas. É seguro afirmar que não existirá ninguém no mundo que nunca tenha sentido ansiedade em algum momento da vida. Habitualmente a ansiedade, quando sentida com baixos índices de intensidade, é um estado normal de um processo de adaptação a algo novo, para nos manter em estado de alerta. No fundo, funciona como um aliado para a preservação da espécie, sendo que se trata de uma reação automática que se ativa quando percebe perigo.
A ansiedade e as novas experiências
As experiências que a vida nos vai permitindo vivenciar são essenciais, ainda que não as únicas, para que nos possamos construir enquanto seres humanos. Estas experiências permitem-nos conhecer e prever o nosso comportamento face a determinadas situações. Certo é que todos nós, pela vivência repetida, sabemos como vamos comportar-nos quando vemos que a fila do supermercado tem vinte pessoas à nossa frente. Os mais pacientes sabem que podem perfeitamente esperar, os mais impacientes sabem que vão ficar aborrecidos na fila, enquanto outros sabem que deixam as compras para trás e voltam noutro dia.
Mas voltemos à gravidez; se estou grávida pela primeira vez, como sei o que esperar do meu comportamento? Esta é a dúvida da maioria das grávidas que apresenta sintomatologia ansiosa durante o período gestacional; grande parte das vezes a ansiedade não está diretamente relacionada à gravidez, no que ao processo gestacional diz respeito, mas sim ao momento do parto e à sua capacidade de desempenhar o papel de mãe.
Ansiedade na gravidez… é normal?
A ansiedade na gravidez é normal e, dependendo da intensidade dos sintomas, esta emoção pode ser adaptativa, ou seja, uma ansiedade que deixa a grávida atenta aos sinais e que impulsiona a procura do saber. Não obstante, a ansiedade pode ser percebida através da manifestação marcada de medo, nervosismo, perceção de perigo iminente, sentimentos de fraqueza, dificuldades de concentração, problemas associados ao sono ou a situações gastrointestinais. Estes sintomas são clinicamente significativos mediante a duração e a intensidade da sintomatologia e, neste caso, a ansiedade deixa de ser uma aliada, transformando-se num fator impulsionador para a probabilidade do aparecimento de uma perturbação de ansiedade.
O facto de sermos animais racionais muitas vezes joga contra nós. Possuímos a capacidade de pensar, refletir, processar informação, imaginar, conjeturar e encadear ideias, o que resulta na procura constante do melhor livro e da dica perfeita, afastando-nos do que a natureza melhor nos ofereceu... o instinto. Ao estarmos demasiado ansiosas, o nosso organismo foca-se em procurar o perigo em tudo à nossa volta. Por isso, é importante que se lembre que estamos biologicamente preparadas não só para procriar como para parir e para assegurar o bem-estar dos nossos bebés, não deixando que nenhuma necessidade básica fique por cumprir. Claro que não quero com isto dizer que não devemos informar-nos! É fundamental que as futuras mamãs tenham consciência do que podem esperar durante o trabalho de parto, no parto e após a gravidez. Com o intuito de alertar para a necessidade desta tomada de consciência, a literatura recente reforça a importância de frequentar cursos de preparação para o parto e para a parentalidade durante o período gestacional. O acesso a informação transmitida por profissionais de saúde tranquiliza os casais e os níveis de ansiedade diminuem por não perceberem o futuro como uma experiência completamente nova.
Como lidar com a ansiedade na gravidez
Importa reter que todas as grávidas são diferentes. Todas as futuras mamãs têm um passado diferente e, por isso, com construções da vida totalmente exclusivas de cada uma; todos os medos são válidos e todas as dúvidas são pertinentes!
Então, se está grávida e está ansiosa, tente perceber se essa ansiedade é adaptativa, ou se, pelo contrário, se traduz num medo que a impede de executar (ou ponderar executar) alguma tarefa.
A título de exemplo, ao meu consultório chegam muitas futuras mamãs com pânico ao parto normal. Ora, este medo bloqueia-as de sequer ponderarem a hipótese de o bebé nascer de parto natural. No entanto, todos sabemos que, ainda que se marque uma cesariana, o bebé pode “decidir” nascer mais cedo e, a mãe (casal) deve estar preparada para todos os cenários possíveis.
A ansiedade é o espelho de um conjunto de pensamentos que distorcem a realidade e que, como consequência, condicionam o nosso comportamento, por isso a intervenção psicológica a este nível tem por base a identificação dos pensamentos automáticos desajustados e a substituição destes pensamentos por outros mais funcionais.
Se, eventualmente, se identifica com a situação, não propriamente com o problema, mas no que confere à angústia/medo persistente e intenso de executar uma ação, deve procurar a ajuda de um profissional de saúde mental.
Artigo originalmente publicado na primeira edição da Revista De Mãe para Mãe, em outubro de 2019.